Década de 1910 - Parte II
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A revolução do futebol - 1915
O futebol era inevitável. Alguns sócios vascaínos acompanhavam o novo esporte e chegavam a torcer para outros times por falta de opção, pois os clubes portugueses fundados não prosperaram. Um de seus problemas foi a restrição - a moda inglesa - de brasileiros em suas fileiras. Mas havia um clube preparado para unir os então dispersos membros da colônia lusa com os brasileiros, os futuros soberanos da bola. Era o democrático e vencedor Club de Regatas Vasco da Gama, o dono do mar do Rio de Janeiro. Assim pensava a diretoria do novo presidente Raul da Silva Campos ao considerar a criação do departamento de futebol vascaíno, através de proposta de fusão com o que restara do Luzitânia S.C. Mas para atingir seu objetivo, o presidente teria que sobrepujar o conservadorismo de alguns homens do remo.
O novo Vasco da Gama - 1915
Pelo remo o Vasco nasceu, pelo remo o Vasco se tornou o maior de todos. Mas foi o futebol que tornou o Vasco um colosso. E esse futuro glorioso foi garantido pela Assembléia do clube no dia 26 de novembro de 1915. Esta votou a favor da proposta de fusão com o Luzitânia, apesar do parecer contrário formado por Alberto de Carvalho e Joaquim Baltar Junior, que eram duas das maiores forças políticas do clube.
O Vasco fazia a mutação que o permitiu sobreviver através dos tempos. Fez isso sem abandonar a tradição, pois no remo o clube continua, como era, o maior dos campeões. Na verdade o Vasco, aliando a tradição com o vanguardismo, somente buscava a maneira de alcançar seu ideal: vencer sempre.
Primeiros passos - 1916
Vencida a resistência interna, pôde o Vasco começar a sua trajetória no futebol, porém o inicio não foi nada fácil: do material trazido pelos sócios do Luzitânia se aproveitou pouco. Era preciso também mandar fazer camisas para o time e pagar a inscrição, uma alta soma, na Liga Metropolitana de Futebol. O novo departamento acarretaria grandes despesas em um clube que se esforçava financeiramente para estar na liderança do remo, até hoje um esporte muito caro. Se não fosse a abnegação dos sócios o futebol do Vasco acabaria ali, mas à vontade de fazer o Vasco forte era maior do que as dificuldades e tudo foi pago do próprio bolso dos vascaínos. Que belo exemplo, como tantos outros que nos deram os sócios do Vasco.
Mas ainda faltava um campo para treinamentos e foi preciso pedir emprestado a prefeitura um local na Praia do Russel. Esse problema de não ter campo próprio ainda atormentaria o Vasco por mais uma década, tempo demasiadamente longo tomando como prisma a capacidade realizadora dos vascaínos. O mesmo não se pode dizer de nossos rivais que até o momento, um século depois, ainda não conseguiram construir nada maior do que um atual campo de pelada. Resolvidas essas questões, o Vasco se apresentava para disputar o primeiro campeonato de futebol de sua história: a terceira divisão do campeonato carioca de 1916.
A terceira divisão - 1916
Antes da primeira partida pela terceira divisão da Liga Metropolitana, o Vasco tinha feito dois amistosos, de resultados desconhecidos, com o Royal F.C e o Catete F.C. Mas foi o dia três de maio de 1916, em jogo realizado no campo do Botafogo, que oficialmente marcou a estréia do clube em uma partida de futebol. O resultado foi desastroso: uma derrota de 10 x 1 para o Paladino F.C. O gol marcado pelo Vasco foi de autoria de Adão Antonio Brandão e este entrou para a história como o primeiro a balançar a rede com a camisa vascaína. Também faziam parte da equipe: Antonio Pereira de Azevedo, Frederico Eisenwlker, Álvaro Araújo Sampaio, Vitorino Rezende Silva, Antonio Bebiano Barreto, Augusto Pereira d’Azevedo, Oscar Guimarães, Mário Moraes, Joaquim d’Oliveira e Manoel d’Oliveira. Talvez a estréia tenha sido precipitada, mas serviu para constatar que os portugueses do Luzitânia, que formavam a base do time, não bastariam para colocar o Vasco no caminho das vitórias. Faltava ainda o talento brasileiro. E neste momento começou a ser escrita a mais bela história de um clube brasileiro, história essa que teria como clímax o campeonato de 1923.
Em um esporte dominado pelos racistas, o Vasco começaria, nos anos seguintes, a recrutar jogadores sem olhar para a cor da sua pele ou pelo seu status social. Negro e branco, rico e pobre, todos encontraram abrigo sob a cruz de malta, pois no mais democrático dos clubes o que importava era o talento e todos, de maneira igualitária, teriam as oportunidades que foram negadas pelos clubes preconceituosos de então.
A primeira vitória do Vasco só viria no returno, 2 x 1 sobre o River F.C. Foi a única vitória daquele ano e o clube acabou em último lugar. Porém o Vasco ao invés de desanimar, continuou firme. O desejo da conquista era muito maior do que aquele revés. O tempo se encarregaria de provar a insuperável capacidade de superação dos vascaínos: o clube que terminou na lanterna foi o único da competição que sobreviveu através dos tempos. Apesar do primeiro campeonato disputado ter um resultado péssimo dentro de campo, fora dele o futebol dava mostras do que significaria para o futuro do Club de Regatas Vasco da Gama. Os sócios se multiplicavam e muitos daqueles que acompanhavam o esporte da bola passaram a torcer pelo clube, aumentando assim sua torcida.
A consolidação do futebol – 1917/1918/1919
O sucesso do campeonato de 1916 atraiu a atenção de clubes cariocas de outras federações e estes ingressaram na Liga Metropolitana para a disputa do ano seguinte. Para evitar o inchaço de participantes, todos os clubes da terceira divisão, incluindo o Vasco, foram automaticamente promovidos para a divisão seguinte, enquanto os novos clubes começariam na terceira em 1917.
E dentro da filosofia democrática vascaína, dessa vez tudo seria diferente. O time é inteiramente mudado e as vitórias começam a vir. Em 1917, dentre tantos sucessos, o Paladino F.C, de triste lembrança na temporada anterior, é derrotado duas vezes. O verdadeiro Vasco da Gama começava a surgir naquela temporada e o clube acabou em quarto lugar. No ano seguinte, a terceira posição é conquistada e o interesse dos vascaínos pelo futebol não para de crescer. No campeonato de 1919, o Vasco busca reforços na Liga Suburbana - a mais humilde das ligas, dos negros e mestiços - e a equipe se fortalece ainda mais. Na verdade esse triênio serviu como afirmação do futebol no Vasco, pois fazendo campanhas dignas para um principiante, a modalidade ganha prestígio no clube.
Unido para vencer - 1919
Como é sabido, o Vasco originalmente é um clube de remo e os diretores desse esporte ainda eram uma força considerável na política do clube quando o futebol foi implantado. Alguns destes ficavam, com razão, receosos do remo ser enfraquecido pela ascensão do esporte da bola. Ganhar novamente o campeonato de remo serviria para provar que o Vasco era tão grande que os dois esportes poderiam conviver harmoniosamente e com sucesso. E foi isso que a guarnição do velho "Pereira Passos" conseguiu ao chegar em primeiro na prova do campeonato de 1919. Festa em Santa Luzia e na Ilha do Engenho, onde eram comemorados os primeiros títulos do remo. Devido ao futebol, agora os vascaínos já eram uma multidão e todos vibravam com a retomada da hegemonia do mar carioca. O Vasco era um só, não poderia haver facções de remo e de futebol no clube, ambos teriam que seguir de mão dadas rumo à glória. Um fato exemplifica bem esse pensamento: Adão Antônio Brandão, um dos pioneiros do futebol e autor do primeiro gol do Vasco, foi um dos remadores campeões de 1919.